A Universidade Planetária do Futuro, em sua vocação humanista - planetária
divulga um importante texto de Alessandro Barreta Garcia:
O LAZER DA MULHER NA MODERNIDADE
Tem-se notado que a mulher é cada vez mais participante do mercado de trabalho, principalmente a partir dos anos de 1970 quando o movimento feminista no Brasil se mostrou com maior clareza. Neste sentido a aproximação da mulher economicamente ativa ao homem, tem representado mudanças na sociedade, onde a mulher se supera a cada dia em relação a sua contribuição familiar. Porém esta igualdade plena ainda depende de muitas outras mudanças tais como; igualdade nos cuidados com os filhos, equiparação salarial, autonomia feminina entre outras variáveis e conseqüências.
De acordo com um levantamento de Aquino et al (1991), a possibilidade de novos agravamentos a saúde feminina e uma possível equiparação das causas de morte por fatores tais como; uma maior inserção da mulher no mercado de trabalho, na vida pública e no já reconhecido cuidado com o lar e com os filhos, parece preocupar o âmbito de saúde pública, em especial a saúde da mulher. Neste sentido é possível que a dupla jornada de trabalho e a falta de horas disponíveis para o lazer possam interferir negativamente na vida de mulheres casadas, economicamente ativas, de baixa renda e com filhos.
É possível que dupla jornada (trabalho doméstico, mais trabalho formal) feminina esteja contribuindo para uma deterioração da auto-estima, depressão, cansaço fisco, tornando-se um profundo estimulador do esgotamento mental. Sendo assim é preciso entender que esta tarefa não é apreciada pelo gênero feminino, mas pode estar sendo su portado de forma cultural e tradicional. Enfim a inexistente cultura de lazer é de extremo interesse para o âmbito de saúde pública e alarmante em termos de políticas educacionais e culturais aos educadores físicos.
O trabalho feminino (dupla jornada de trabalho) se levado a sério, lembra-nos o trabalho fabril no início do possesso capitalista dos séculos XVII e XVIII, sendo esta dupla jornada um grande impedimento para o lazer entre mulheres economicamente ativas.
Inicialmente Mourão (1999) levanta as angustias e as limitações que a mulher sofre quando na posição de baixa renda. Perdem muito tempo na condução a caminho do serviço, e chega muito tarde em casa, por volta das 10 horas da noite e ainda assim continuam suas duplas jornadas de trabalho. Entre mulheres bóias frias a realidade não é diferente: a dupla jornada de trabalho, o doméstico e o da roça fazem parte de suas vidas (Pires, 2001).
Recentemente Garcia (2005 ) investigou que muitas vezes as únicas formas de lazer dessas trabalhadoras (funcionárias de creches e operarias da indústria de calçados) e, sobretudo auxiliares de limpeza resumem-se a escutar rádio e assistir TV. Basicamente o único tempo destinado ao lazer encontra-se nos finais de semana, quando se reúne a família. Notamos ainda que as diferenças entre as idades e entre os graus de escolarização, parecem favorecer as mais jovens e mais escolarizadas sendo possível um maior comprometimento com o lazer.
Acredita-se que para uma cultura corporal de lazer seja necessária uma Política Educacional de Saúde, tanto na infância como na adolescência. Porém não se deve executar a prática do exercício físico, simplesmente pela prática, mas acima de tudo entender sua importância histórica, social e cultural. Sendo esta uma prática relativamente e socialmente determinada por uma cultura corporal mediante família Estado e Sociedade, assume-se que esta deve ser encarada como um problema de Saúde Pública bem como um problema para com os educadores físicos nas escolas.
Além da repercussão negativa da dupla jornada de trabalho, impossibilitando essa mulher economicamente ativa de participar de atividades de lazer, também são apontados os prováveis efeitos deletérios para com sua saúde (desgaste físico, distúrbios osteomusculares, dores na coluna, pressão arterial alta, sofrimento, varizes) (Motta & Neto, 1985; Marcon & Koga et al, 1997; Rocha, 1999; Rocha, 2001; Medeiros & Martins, 2002). Segundo Verbrugge apud Aquino & Menezes et al (1991), para além das doenças eminentes como as cerebrovasculares, pulmonares entre outras, tem se destacado que a grande participação das mulheres como chefes de família, com maior organização política e ingresso no mercado de trabalho possam não estar trazendo vantagens quanto ao tempo de sobrevida, principalmente em função do excesso de a tribuições domésticas, maternas e trabalho formal.
Salientamos também, o grande desejo de mudanças na dinâmica da divisão do trabalho, a partir dos resultados extraídos de Ladeira (2000). Segundo essa autora, o trabalho doméstico, o cuidado com os filhos, o pagamento de contas e as compras de supermercado, são responsabilidades comuns da vida conjugal. Porém, presumimos que uma visão mais crítica a este respeito é pouco observada entre mulheres de baixa renda, e possivelmente mais comum entre mulheres com maior nível econômico e maior nível educacional.
Neste sentido acreditamos que os resultados, em termos de dupla jornada e cultura corporal, poderão ser alterados à medida que houver maior nível educacional, social e maior compreensão dos direitos para com a liberdade e para com a melhora na condição de vida entre mulheres que trabalham.
Enfim, para que a cultura corporal se estabeleça entre mulheres que trabalham, é necessário que ocorram intervenções educacionais, para que se construa um aparato que no nosso entendimento é relativamente social e historicamente determinado por variáveis individuais, sociais, econômicas e políticas e culturais.
A ausência do desenvolvimento em praticamente toda a esfera cultural do lazer, em especial qualquer tipo de cultura corporal de movimento precisa ser repensado, não só no âmbito de Políticas Públicas como também no âmbito educacional. Dumazedier (2001) acrescenta, "A debilidade da renda leva a um modo de vida comum entre pessoas da mesma condição, de tal modo que nem mesmo o lazer gratuito é capaz de despertar interesse e obter sucesso, especialmente entre operários" (84.p, 2001).
Por fim o estabelecimento de uma cultura corporal de lazer não tem se mostrado como se apresenta o chamado processo democrático do lazer. Mesmo com a diminuição da carga horária de trabalho após as lutas sindicais, não e ntendemos o lazer como uma prática acessível a mulheres em diferentes ocupações no mercado de trabalho, principalmente aquelas que se encontram menos favorecidas.
Neste sentido é preciso de mudanças efetivas na dinâmica do Estado, sendo as mudanças não mais paliativas mas sim efetivas. É preciso de liberdade para o lazer, um lazer de qualidade e não apenas radio e TV no qual qualquer individuo com discernimento pode concordar com a péssima qualidade do veiculo de entretenimento.
O lazer deve ser alcançado por todos e deve-se ter a liberdade de escolha do tipo de lazer, seja para com a cultura corporal de movimento, para a leitura o para o estabelecimento da de um maior aporte de cultura geral, tal como, assistir bons filmes no cinema, ir a bons teatros, bons espetáculos, enfim, viajar, pescar, e escutar boas músicas.
As Políticas Públicas neste caso são importantes apenas como medida paliativa, é o mínimo que se possa espe rar do Estado, mas não é suficiente não tem continuidade, e qualidade e nem mesmo respeita o direito de liberdade, pois é uma imposição do Estado, muitas vezes servem apenas como pão e circo para distrair o povo desorganizado, não politizado e não consciente das verdadeiras ideologias de dominação.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
AQUINO, E. M. L, MENEZES, G. M, AMOEDO, M. B. E, et al. Mortalidade feminina no Brasil: Sexo frágil ou sexo forte. Cadernos de Saúde Pública, 7 (2) 174- 189p, 1991.
DUMAZEDIER, J. Lazer e cultura popular. Perspectiva, 2001, 334p.
GARCIA, A. B. Representações sociais da cultura corporal de lazer entre mulheres auxiliares de limpeza. Lecturas educacion fisica y deportes (Buenos Aires), Buenos Aires, v. 10, n. 85, p. 01-13, 2005. (acesso em 30/05/05).
LADEIRA, K. F. Dupla jornada da mulher e qualidade de vida: A influencia do nível socioeconômico nas estratégias de conciliação entre o tempo labor al e o tempo familiar. Magister Scientiae em Economia Doméstica - Universidade Federal de Viçosa, Minas Gerais, 2000, 91p.
MARCON, S. S, KOGA, M, WAIDMAN, M, A. P, et al. O trabalho da mulher: O confronto com a realidade familiar. Texto e Contexto Enfermagem, Florianopolis, v.6, n.1, p. 135-156, 1997.
MEDEIROS, M. H. R, MARTINS, G. O sofrimento mental feminino e sua relação com o trabalho doméstico na cidade de São Carlos (SP). Jornal Brasileiro de Psiquiatria, v. 51, n.4, p. 247-258, 2002.
MOTTA, A. B, NETTO, Z.M. Tempo de mulher - tempo de trabalho entre mulheres proletárias em Salvador. Ciência e Cultura, v. 37, n. 9, p. 1442-1451, 1985.
MOURÃO, L. Representação social da relação do trabalho feminino da diarista com as opções de lazer na comunidade de queimados. Motus Corporis, Rio de Janeiro, v. 6, n. 2, p. 52-72, nov, 1999.
PIRES, A. G. M. G. As vozes do algodão: Bóias-frias e suas representações sociais de tempo livre e lazer. In (Org) VOTRE, S. Imaginário e representações sociais em educação física, esporte e lazer. Rio de Janeiro - Editora Gama Filho, 2001, 344p.
ROCHA, A. M. Fatores que influenciam a saúde da mulher que trabalha em enfermagem. O Mundo da Saúde, São Paulo, ano. 23, v. 23, n. 2, 1999.
ROCHA, L. E, DEBERT-RIBEIRO, M. Trabalho, saúde e gênero: estudo comparativo sobre analistas de sistemas. Revista de Saúde Pública, v. 35, n. 6, p. 539-47, 2001.
Web site: http://www.ongdarolha.com/
Autor: Alessandro Barreta Garcia
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Brasil, 13 de janeiro de 2011
Divulgação acadêmica:
Profa. Dra. Maria de Fátima Félix Rosar
Diretora do Centro de Ciências Sociais - U. P. F.
U. F. P. - Universidade Planetária do Futuro - Ano II:
Ana Maria Felix Garjan, presidente.
Universidade Planetária do Futuro - Ano II
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